quarta-feira, 18 de agosto de 2004

Discurso de formatura

Esta é a transcrição do meu discurso quando de formatura. Fui orador e me pediram para falar um pouco da fisioterapia. Já faz mais de um ano e meio, se fosse hoje, eu faria um pouco diferente, mais ainda gosto dele mesmo assim.


Fisioterapeutas,
Agora nos somos fisioterapeutas.
Mas o que exatamente isso significa?
Muitos, a maioria entra na faculdade sem saber direito o que isso significa.
Essas pessoas, os professores, cada uma do seu jeito, tentaram nos mostrar um pouquinho do que é este amplo universo da fisioterapia.
Uma profissão que é ainda muito nova no Brasil e no mundo, e por isso não devemos culpar ninguém por ainda não saber exatamente do que se trata.
Por ainda dizer que o que nos fazemos é apenas umas massagenzinhas... Quer deixar um fisioterapeuta chateado é dizer isso.
Então o que é a fisioterapia?
Bom, eu sou suspeito pra falar, por que sou apaixonado pela coisa, mas vou tentar:
Fisioterapia; fisio de física, pois se utiliza recursos físicos e não químicos.
Quais recursos físicos?
Eletricidade como no tens e nos aparelhos de corrente; calor; som, como no ultrasom; frio, gelo e o mais importante de todos: o toque e o movimento.
Muito bem, e o que é que a gente faz com estes recursos?
Podemos prevenir... Podemos tratar... Podemos curar...
Mas principalmente, nos reabilitamos.
Re-abilitar alguém a sociedade
Nosso papel é de aceitar o diferente, o incapacitado, de acreditar nele, de faze-lo acreditar em si, e de finalmente, fazer dele capaz novamente.
E os principais instrumentos que utilizamos neste trabalho são nossas mãos e o nosso bom senso.
E é por isso que nenhuma maquina pode substituir o trabalho que a gente faz.
Nenhuma maquina nunca será capaz de imitar a relação que acabamos desenvolvendo com os pacientes. É uma relação muito próxima, pois envolve o toque; é uma relação de parceria, que pode durar anos. Às vezes, nos tornamos seus confidentes, estando sempre ali pra apóia-los, e não é raro nos tornamos até parte da família.
Mas tudo isso que eu disse aqui ainda é pouco, pois nem eu, nem ninguém, ainda sabe completamente o que é a fisioterapia, e onde ficam seus limites.
Nos agora temos a missão e a responsabilidade de ajudar a construir essa a cara desta profissão.
Nos agora somos fisioterapeutas.

sexta-feira, 6 de agosto de 2004

Do livro que estou lendo agora

"A propósito, contarei um caso. Conheci uma mocinha da passada geração "romântica", a qual, depois de alguns anos de misteriosa paixão por certo cavalheiro, com quem, aliás, se poderia ter casado da maneira mais pacifica, inventou obstáculos intransponíveis e, em noite de tempestade, atirou-se de uma alta margem, parecida com um penhasco, numa torrente profunda e rápida, morrendo, por seu próprio capricho, apenas para se parecer com a Ofélia de Shakespeare. Se a elevação que ela tanto gostava de contemplar fosse um pouco menos pitoresca ou, em seu lugar houvesse uma margem prosaicamente plana, é provavel que nunca se suicidasse. Este fato é verídico e parece que outros semelhantes ocorreram entre nós, com certa frequência, nas últimas duas ou três gerações."
Fiódor Dostoiévski

segunda-feira, 2 de agosto de 2004

Lendo Lolita em Teerã

Na República Islâmica pós-revolucionária, Azar Nafisi, até então professora de literatura inglesa, decide pedir demissão de seu cargo de docente na universidade. Motivo: numa nação em que mulheres não podem mostrar mechas de cabelo ou usar maquiagem, onde conversas, debates e até apertos de mãos passam pelo crivo da censura, ela acha que literatura combina apenas com liberdade.
Nafisi decide então pôr em prática um antigo sonho: reúne sete de suas melhores alunas para encontros semanais em sua casa, a fim de ensinar e discutir obras da literatura inglesa cuja leitura era proibida no país. São sete mulheres - ou oito, se contarmos com Nafisi - que não são muito íntimas e que possuem histórias pessoais diferentes umas das outras; algumas delas, aliás, precisam mentir para estarem ali, naquele encontro considerado subversivo.
Lolita, Madame Bovary, Orgulho e Preconceito são alguns dos títulos discutidos. Mas mais do que ensinar literatura, Nafisi deseja que suas alunas se deixem penetrar pela magia das palavras; que a ficção faça parte da vida delas e realmente influencie seus pensamentos, vontades e reflexões.
A beleza do livro é exatamente esta: mostrar, de forma poética, o que a crítica literária convencionou chamar de estética da recepção. O que isto quer dizer? Quer dizer que uma obra literária - ou, indo além, qualquer obra de arte - só tem importância a partir do significado dado a ela pelo leitor. É o que Umberto Eco chama de 'obra aberta': a literatura deixa vãos, que devem ser preenchidos pelos olhos - pensamentos, sensações- daquele que a lê. E, na vida daquelas sete mulheres, Nafisi tentou colocar as cores dos sonhos em seus quotidianos, habitualmente tão submissos a regras e represálias. Quando suas alunas chegam às aulas, elas certamente despem mais que seus véus.
A literatura existe para que nossos sonhos possam continuar vivos. Ou, nas palavras de Nafisi, a literatura é "uma possibilidade de liberdade ilimitada, quando todas as opções são negadas."

Lendo Lolita em Teerã - Azar Nafisi
Editora A Girafa